30 de julho de 2008

RELATÓRIO DA OPERAÇÃO SATIAGRAHA REVELA LIGAÇÕES DE DANIEL DANTAS COM MINISTRO

As investigações da Operação Satiagraha, da Polícia Federal (PF), demonstram que as investidas do grupo Opportunity, do economista Daniel Dantas, na região Amazônica receberam ajuda de peso no governo federal. O relatório de inteligência nº 8/2008, produzido em maio pelo delegado Protógenes Queiroz, faz referências ao ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, como figura fundamental nos projetos de mineração e agronegócio – nova aposta de investimentos do grupo –, principalmente no Pará.
Dantas é apontado pela PF como mentor de um esquema bilionário de corrupção e movimentações financeiras irregulares, com participação, entre outros, do megainvestidor Naji Nahas e apoio político do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta. Nos últimos três anos, o grupo Opportunity, que é formado por cerca de 150 empresas, aplicou recursos na Amazônia que resultaram, só no Pará, em 600 mil hectares de terras adquiridas e cerca de meio milhão de cabeças de gado.
O ministro Mangabeira que prestou consultoria jurídica entre 2002 e 2005 para a Brasil Telecom nos Estados Unidos, durante a gestão Dantas, é o responsável pelo Programa Amazônia Sustentável (PAS). O programa, entre outras metas, prevê estratégias que aliem a política de contenção do desmatamento ao desenvolvimento regional. É de se imaginar que a realização da tarefa seja algo complicado para Mangabeira quando se contrapõem os interesses de seu ex-chefe e o fator da proteção ao meio ambiente – tema de repercussão internacional e política prioritária de outro ministério, o do Meio Ambiente.
Antes de assumir a função no governo, em 2007, Mangabeira consultou a Comissão de Ética Pública da Presidência para saber se poderia compatibilizar suas funções junto ao grupo de Dantas com a de ministro. Ou seja, mais um elemento para Protógenes reforçar a tese de mútuo benefício entre o economista e Mangabeira, agora na esfera federal. Mas o colegiado disse não.
É aí que a questão fica mais espinhosa para Mangabeira. No início de maio, em uma reunião entre ele, o presidente Lula e a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ficou definido que Mangabeira seria o responsável pela execução do PAS. Marina não teria gostado da idéia e, sentindo-se desprestigiada, pediu demissão dias depois – provavelmente contrariada não só com a transferência de atribuições, mas também com a suposta atuação de Mangabeira em prol dos interesses de expansão comercial na Amazônia.
“Foi o estopim. Quando o governo passou a autorização de uma tarefa que era dela [Marina] para o Mangabeira, ela se sentiu inferiorizada”, afirmou o senador Expedito Júnior (PR-RO). Ele acrescenta que a ministra programava uma política de “ferro e fogo” no combate ao desmatamento na Amazônia, em detrimento da geração de empregos e da atividade de fazendeiros e madeireiros, inclusive com retardamento na emissão de licenças ambientais para projetos de desenvolvimento.
Defensor do agronegócio, amigo e aliado político do governador rondoniense Ivo Cassol – com quem a ex-ministra Marina tinha fortes divergências acerca da questão ecológica –, Expedito acha preocupante a relação do ministro Mangabeira, à frente do PAS, com um empresário cujo novo nicho de investimento pode significar ainda mais problemas ambientais para a região.
Em trecho de seu relatório final de 7 mil páginas, com cerca de uma tonelada de material investigativo, o delegado Protógenes Queiroz aponta que, “ao que tudo indica, Mangabeira estrategicamente favorecia a política de expansão do Norte do país buscada por Dantas”. Segundo ele, Mangabeira funcionava com uma fonte privilegiada de “informações estratégicas” no governo federal, auxiliando o grupo Opportunity nos setores do agronegócio e da mineração.
Terra de alguém
Na última sexta-feira (25), cerca de mil integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) invadiram a Fazenda Maria Bonita, uma das propriedades de Dantas no Pará no município de Xinguara. A região é palco de graves problemas fundiários. A fazenda fica a cerca de 25 quilômetros de Eldorado dos Carajás, onde, há 12 anos, um conflito com a Polícia Militar levou à morte 19 trabalhadores sem-terra.
O MST diz que a fazenda invadida está localizada em terras públicas e foi ilegalmente obtida, em 2005, pela Agropecuária Santa Bárbara Xinguara S/A, que tem como diretora a irmã de Daniel Dantas, Verônica Dantas. O movimento explica ainda que o Instituto de Terras do Pará (Iterpa) confirma que a terra pertence à União – logo, sua comercialização é proibida. E sinaliza que pode vir a ocupar outras terras do economista: as fazendas Cedro e Espírito Santo, ambas no Pará, que também seriam públicas e irregularmente adquiridas.
Alegando a lentidão, por parte do governo federal, no processo de criação de assentamentos e da própria Reforma Agrária, o MST sinaliza que novas propriedades de Dantas podem ser invadidas. “Lugar de ladrão é na cadeia e as terras públicas são para a Reforma Agrária”, enfatizou Ulisses Manacas, membro da diretoria do MST no Pará.

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