17 de outubro de 2009

PARA BISPO, "REVITALIZAÇÃO DO RIO É MAROLHINHA"

Por Matheus Magenta

Da Agência Folha, em Salvador
FOLHA DE S. PAULO

Crítico da transposição das águas do rio São Francisco, o bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, 63, disse que o projeto é um "tsunami" e que as obras de revitalização do rio promovidas pelo governo federal são "marolinhas" -termo que o presidente Lula usou para se referir aos reflexos da crise econômica global no Brasil. Cappio fez duas greves de fome contra a transposição, em 2005 e 2007. Nos últimos dias, quando uma comitiva presidencial visitou a região -passando também por Barra-, o bispo não estava na cidade. Mas organizou à distância um protesto no dia da visita de Lula.
FOLHA - O sr. acha que a visita do presidente a Barra foi provocação, para mostrar que as obras estão em andamento apesar das críticas?
DOM LUIZ FLÁVIO CAPPIO - Quero usar as próprias palavras do presidente, quando ele falou que a crise econômica era uma marolinha para o Brasil. O projeto de transposição segue como um tsunami violento. Está lá o Exército desmatando tudo, passando por cima de vilas e aldeias, de roças e de gado, para garantir o trabalho. E as obras de revitalização, que são essenciais para a vida do rio São Francisco, são marolinhas, coisas insignificantes.
FOLHA - A Presidência convidou o sr. para ir ao evento?
CAPPIO - Se me ligaram, eu não sei porque não estava aqui. E, mesmo que eu fosse convidado, eu não iria porque não participaria de uma mentira.
FOLHA - Por que "mentira"?
CAPPIO- O que o presidente veio fazer em Barra foi apenas um marketing de mídia para mostrar para o Brasil e para o mundo algo que não existe, uma farsa, uma mentira. O projeto de revitalização não acontece. Foi mais uma de suas grandes mentiras sobre esse projeto. Foi apenas um show.
FOLHA - Apesar de não estar no município, o sr. organizou um protesto. Por que os sinos da igreja tocaram o dobre fúnebre?
CAPPIO - Foi a única maneira de homenagear aquele que está matando o rio em nome da ganância.
FOLHA - O presidente Lula?
CAPPIO - Sim. Durante a minha vida toda fiz tudo para colocar Lula na Presidência. Mas, infelizmente, uma vez que ele se tornou presidente, ele passou a governar o Brasil pensando nas grandes elites, como esse projeto de transposição que garante apenas a segurança hídrica de grandes projetos de irrigação. Se o projeto realmente levasse água a quem precisa, eu seria o primeiro a apoiá-lo.
FOLHA - O andamento do projeto representa uma vitória do governo?
CAPPIO - É vitória não da democracia, mas de uma postura ditatorial do presidente. A sociedade civil brasileira quis discutir o projeto, mas ele jamais aceitou. Ele impõe a transposição à revelia da sociedade.
FOLHA - O projeto de revitalização é suficiente para recuperar o rio?
CAPPIO - É muito pouco, não atinge o essencial. Esses projetos de saneamento básico são importantes, mas não significam uma revitalização do rio. O que deveria ser feito é garantir a revitalização de todas as nascentes dos afluentes do rio, das lagoas, das regiões que geram vida ao rio. A maioria delas está morta. E não apenas em 300 km, mas em toda sua extensão. Quem fala sobre esses números não conhece realmente o rio.
FOLHA - Dilma Rousseff afirmou que os críticos não conhecem o rio.
CAPPIO - Que conhecimento que a Dilma tem do rio São Francisco? O que ela sabe é de ouvir falar. Chega de mentir para o povo. Nós tivemos aqui na Barra um show. Foi um show de política em véspera de eleição. Tenho pena de pessoas que se deixam enganar com aquilo.

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