2 de maio de 2009

EDITORIAL DA GAZETA (ES)

2/5/2009O Palácio do Planalto ainda não aplica a dose politicamente correta para uso do cartão corporativo. A falta de senso de conveniência na manipulação desse crédito já provocou escândalo. No início de 2008, derrubou a ministra Matilde Ribeiro, titular da Pasta da Igualdade Racial desde março de 2003. Mas os gastos continuam a expor o governo a críticas e a desconfianças gerais, em função do crescimento.Desde o Caso Matilde Ribeiro, órgãos de controle do Executivo expediram orientação para que as despesas com cartões fossem feitas com parcimônia, restingindo-se a situações consideradas inevitáveis. Sempre deveria ter sido assim, e não apenas em relação a cartões. Chegou com muito atraso a preocupação disciplinar. E há demonstrações de que não está sendo bem cumprida. Os números continuam assustando os cidadãos que enxergam a necessidade de enxugamento nos dispêndios governamentais. De janeiro a março deste ano, o cartão de crédito da União serviu para que fossem sacados, diretamente no caixa, uma média de R$ 48 mil por dia. Significa mais do que o dobro do valor registrado em igual período de 2008: R$ 22,6 mil. Nesse ritmo, no primeiro trimestre de 2009, foram retirados R$ 4.323.787, superando em 112,8% o total de R$ 2.039.354 nos três meses iniciais do ano passado. São números do próprio governo, disponibilizados por meio do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira do governo federal).A norma em vigor desde 2008 na administração pública federal limita os saques com cartão a 30% das despesas totais com suprimentos de fundos, em cada órgão. São os chamados desembolsos excepcionais, feitos sem licitação. Todavia, de acordo com o Siafi, os ministérios da Justiça e da Cultura já sacaram com o cartão, respectivamente, 71,44% e 33,44% do total a ser utilizado. O Ministério da Justiça é campeão no aumento do uso do cartão. No primeiro trimestre de 2008, gastou R$ 149,6 mil; nos mesmos três meses de 2009, a conta saltou para R$ 2,2 milhões, um incremento espetacular de 1.397%. Além disso, também chama a atenção o fato de 78% desse montante ter sido sacado em dinheiro. A Presidência da República fica em segundo lugar na ampliação de despesas com cartão. Considerando o período de janeiro a março, o avanço foi de 242%, passando de R$ 1.228.692, em 2008, para R$ 4.205,956, de um ano para outro. Dois dias após a divulgação desse quadro, o presidente Lula afirmou que existe o excesso de regras e de fiscalização sobre o uso de recursos públicos no Brasil. "A máquina de fiscalização é superior à máquina da produção", disse. O presidente pode até ter razão, mas há alguns aspectos a considerar sobre esse suposto excesso. O primeiro deles é que, em relação ao cartão corporativo, há ministérios que descumprem os limites de saques, fato que implica outro tipo de excesso, o de gastos. E parece ficar por isso mesmo. Não há notícia sobre punição aos descomedidos. A saída de Matilde Ribeiro foi uma exceção criada pela pressão do escândalo, que ganhou manchetes em vários países. Em segundo lugar, há que convir que o conjunto de normas tem o objetivo de frear impetuosidades de gastos nos órgãos do governo e a má qualidade na destinação de recursos. Não precisaria haver regra alguma, se todos os ocupantes de cargos públicos exibissem padrões de excelência nos critérios de uso do dinheiro da população. O setor público ainda deve muito à sociedade em termos de transparência de despesas.

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