24 de maio de 2009

NÃO AO TERCEIRO MANDATO

EDITORIAL - JORNAL DO COMMERCIO (PE)
24/5/2009
Quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso começou a manobrar para ter a chance de se candidatar à reeleição, havia uma descrença geral de que ele obtivesse esse desejo. Não que reeleição seja antidemocrático ou imoral. É que os políticos brasileiros, conhecedores dos peculiares costumes que regem a nossa vida nessa área, nunca cogitaram admitir isso, pois significaria que quem quisesse se reeleger sem se afastar do poder sempre o conseguiria distribuindo benesses. De fato, ele teve grande dificuldade em impor sua vontade ao Congresso, havendo até um caso em que foi detectado suborno confesso de deputado. Nos Estados Unidos, nosso espelho de democracia, presidentes sempre puderam se candidatar a reeleições. Franklin Roosevelt foi eleito e reeleito quatro vezes. Depois disso, determinou-se que só haveria uma reeleição. Acontece que os EUA não são uma República imperial, como a nossa. Lá o Congresso tem grande poder e o exerce, não abdicando de legislar e de fiscalizar o Executivo, como faz o nosso. As velhas raposas políticas nacionais tinham razão, como se comprovou. FHC praticamente quebrou o País sustentando uma fictícia paridade do real com o dólar, sua bandeira eleitoral. Seu segundo mandato foi tão problemático que possibilitou a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva em sua quarta tentativa de chegar à Presidência da República. A extensão da reeleição a governadores e prefeitos também tem gerado críticas às vantagens que quem está no poder tem em relação aos concorrentes.Argumentam os partidários da reeleição sem limites de governantes que a Venezuela, a Bolívia, o Equador inscreveram em suas constituições o direito a sucessivas reeleições. Ao que rebatemos dizendo que os métodos caudilhescos de Chávez, Morales, Correa não devem ser exemplos para nós. Eles acreditam, sobretudo Hugo Chávez, presidente da Venezuela, que são iluminados e predestinados, não havendo ninguém com qualidades para substituí-los. O Brasil não pode embarcar nessa onda. Já somos suficientemente politizados para não acreditar mais em salvadores da pátria.O próprio Lula, segundo declarações que vem fazendo sempre que se levanta o tema de sua terceira candidatura a eleições presidenciais, é contra essa mudança. Há poucos dias, na China, reiterou sua posição, no momento em que essa natimorta idéia está sendo requentada. A candidata dele para a eleição presidencial do próximo ano é a ministra Dilma Rousseff e, se não houver novidades até o começo da campanha eleitoral, o panorama eleitoral está esboçado, com ela e mais, pela oposição, José Serra ou Aécio Neves, fora outros.Vozes autorizadas do governo, como o vice-presidente José Alencar, negam que Lula pretenda um terceiro mandato. A idéia esdrúxula parece interessar apenas, no Congresso, ao baixo clero parlamentar, ainda sob a liderança de Severino Cavalcanti, que, apesar de haver renunciado ao mandato para evitar ser cassado, continua gozando de espaços e salamaleques no Congresso e no poder. É um integrante do baixo clero, o desconhecido sergipano Jackson Barreto, que segura no momento a bandeira da reeleição de Lula. Diante da oposição da opinião pública à ideia, dificilmente o Congresso a abraçará, apesar de que muitos maus políticos achem que a opinião pública é desprezível.Por cima de paus, pedras e espinhos, estamos conseguindo consolidar o processo de redemocratização das instituições brasileiras, que haviam sofrido um colapso de 21 anos entre 1964 e 1985. Temos uma Constituição que, apesar de tratadista e casuística, está servindo a esse processo de consolidação democrática. Devemos respeitá-la e não ficar costurando-lhe emendas ao sabor de apetites menores de políticos sem compromisso com o País e o povo. Além de tudo, a ideia de terceiro mandato tem cara de golpe. O Congresso teria somente quatro meses para discutir uma emenda à Constituição, que necessita de ampla maioria de votos. É pouco tempo, exigiria um rolo compressor como o que FHC acionou para ganhar um segundo mandato. E a expressão "terceiro mandato" pressupõe que, se Lula puder disputar, vai ganhar na certa. Basta de golpes.

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