24 de maio de 2009

JANELA OU CORREDOR

EDITORIAL - FOLHA DE S. PAULO
24/5/2009

CPIs perdem o papel num contexto de grande desmoralização, servindo apenas como campo para barganhas políticas

CONTRATOS suspeitos, loteamento de cargos, sonegação de informações. Como parece ser a regra em qualquer setor do Estado brasileiro, nas esferas municipal, estadual ou federal, a Petrobras não se mostra capaz de passar alguns dias sob o foco do noticiário sem que venham à luz indícios de irregularidades.As últimas edições da Folha, a esse respeito, poderiam justificar a abertura de uma penca de CPIs sobre a estatal. Nada menos do que 19 contratos foram celebrados, por exemplo, entre a Petrobras e a empresa GDK -isso depois de ter emergido, vale lembrar, o caso do jipe presenteado por esta empresa a Silvio Pereira, então dirigente do PT.
A constatação de que a maior empresa brasileira constitui uma verdadeira caixa-preta é compartilhada até por setores do governo e, de resto, não se limita à atual gestão petista.O irônico, e também o revoltante, em todo o processo político que se avizinha com a instauração de uma CPI da Petrobras é que não há como esperar do Legislativo brasileiro nenhuma iniciativa realmente moralizadora e eficaz sobre as ações da estatal.
Nascida do ativismo sempre fugaz e desnorteado da oposição, a CPI parece produzir, já nas disputas em torno da composição de seus membros, um efeito ao mesmo tempo paradoxal, previsível e ridículo.
Aumenta, na realidade, o cacife do PMDB em suas pretensões por cargos na empresa. Majoritariamente aparelhada pelo PT, a caixa-preta da Petrobras seria grande o bastante para contemplar um bom número de peemedebistas, em troca de sua colaboração no abafamento das investigações inconvenientes.
Critica-se, com razão, a voracidade do PMDB. Cabe entretanto lembrar que suas reivindicações naturalmente se intensificam quando observa o número de lugares reservados ao PT na mesa do banquete.
Quanto às forças da oposição, não é de agora que se assiste ao arrefecimento de seu ímpeto investigativo quando os escândalos ameaçam as mesmas empreiteiras, consórcios e prestadoras de serviços com que mantiveram tratativas no plano das administrações estaduais e municipais.
De resto, num contexto em que deputados e senadores se veem devassados por uma onda irrestrita e ecumênica de escândalos, é inevitável considerar que a bandeira da lisura administrativa e do combate à corrupção lhes pertence menos que nunca. Afora o que possa surgir de incidência imprevisível nos trabalhos, o instrumento das CPIs perdeu o papel social que possuía no passado.
Torna-se hoje, sobretudo, o campo mal disfarçado de barganhas políticas e de um jogo formal em que oposição e governo, a rigor, poderiam trocar de lugares sem maior incômodo do que, numa viagem aérea rumo a Miami ou Paris, alguém concede em ocupar a poltrona da janela ou a do corredor. Que façam todos uma boa viagem -desde que não, como costuma acontecer, com os recursos do contribuinte.

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