24 de setembro de 2009

UM ANALISTA COERENTE: ESTÁ SEMPRE ERRADO

DO BLOG DO REINALDO AZEVEDO

Ainda sobre o mercado das opiniões: Clovis Rossi escreve hoje na Folha sobre a embaixada brasileira em Tegucigalpa. Acharam o seu texto tão bom que resolveram chamar na primeira página. Rossi diz que o Brasil foi atacado pelo governo Micheletti — uma terrível e sanguinária ditadura, como sabemos — e, pobrezinho!, não tem como reagir. Vocês sabem: Honduras fica meio longe para fazer uma guerra… Pena!
Nem uma miserável palavra sobre o fato de a embaixada estar sendo usada como base da ação política de Zelaya, que não está lá como asilado. Segundo Rossi, cortar água e luz é uma agressão ao território brasileiro. Sim, é mesmo. Mas e o uso do “território brasileiro” para pregar “vitória ou sangue” é o quê?
Nem iria comentar o texto porque se pode acusar Rossi de muita coisa, menos de incoerência. Faz tempo que ele está equivocado sobre a América Latina. Procurem e encontrarão alguns textos antigos seus que indagavam o que Chávez, afinal, estava fazendo de errado na Venezuela, já que sempre recorria a processos eleitorais para levar adiante suas “reformas”… A pergunta não requeria resposta, mas remédio.
Lembram-se daquela tentativa desastrada de deposição de Chávez? Em 2002, Rossi não hesitou em escrever o que segue. Leiam. Volto depois:
O seqüestro da democracia No sábado, o jornal venezuelano “El Nacional” publicou charge em que o presidente Hugo Chávez é retratado como “Baby Doc”, o nefando ditador haitiano da dinastia Duvalier.
É parte de uma campanha para torcer os fatos e mostrar o presidente como um tirano. O que, por sua vez, justificaria sua remoção.
Chávez pode ser tudo o que se quiser, mas não é um tirano. Fatos:
1 - Sua eleição e posterior revalidação do mandato, devido à nova Constituição, foram legítimas.
2 - O Legislativo está aberto e funciona normalmente. Nele, Chávez tem apenas tênue maioria (87 de 165 parlamentares).
3 - Se o Judiciário fosse mero apêndice do “chavismo”, não teria inocentado os militares que participaram do golpe de 11 de abril, que o afastou por 47 horas.
4 - A liberdade de imprensa é tão absoluta que beira a libertinagem. Que tirano aguentaria cinco minutos de críticas ferozes e xingamentos nos meios de comunicação?Chávez aguenta o dia inteiro uma barragem de propaganda negativa, de distorções de fatos e de unilateralismo (a versão oficial mal aparece), em todos os cinco canais privados e em nove dos dez principais jornais.
5 - A liberdade de manifestação é tanta que há marchas oposicionistas dia sim, o outro também.
É verdade que houve mortos em duas dessas manifestações (na véspera do golpe de abril e agora, em dezembro). Mas não está claro quem atirou, se comandos governistas ou oposicionistas (ou ambos).
O que está se fazendo na Venezuela parece muito com o que se fez no Chile contra Salvador Allende. Sabe-se o que veio depois: um tirano, aí sim, que hoje não pode sair do país sob pena de ser preso como genocida.
Se funcionar com Chávez, pode funcionar com qualquer outro presidente legitimamente eleito.
Comento
Viram só? Seqüestradores de democracia eram os inimigos de Chávez. Até eu havia me esquecido de que a tese segundo a qual “há democracia até demais na Venezuela” é, originalmente, de Clóvis Rossi. Lula é só um seu usuário…
Convenham: ninguém precisava endossar a deposição de Chávez, do modo como se deu, para considerar que, em 2002, ele já era um gorila. Vejam o trecho em negrito (ou vermelhito). Ele até admite que houve alguns mortos (Toffoli escreveria: “Houveram alguns mortos…”), mas, vejam bem… Nota: só ele tinha dúvidas sobre a origem dos tiros. Eram os chavistas matando seus adversários. Mas a máquina esquerdopata pôs para circular aquela mesma versão usada mais tarde pelo Irã: “a oposição mata os seus para nos culpar”.
Alguma surpresa sobre o que ele escreve em 2009?

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