20 de janeiro de 2010

O QUE PENSAM OS CANDIDATOS SOBRE QUESTÕES MUNICIPAIS





Rudolfo Lago

Uma das vantagens da atual eleição ainda não ter um favorito destacado é que os três principais candidatos à Presidência não estão se furtando a participar de todas as entrevistas e debates para os quais são convidados. Assim, a posição de cada um vai ficando mais clara para o eleitor.

Desta forma, na manhã de hoje, os candidatos do PSDB, José Serra; do PV, Marina Silva, e do PT, Dilma Rousseff, nessa ordem, expuseram as suas ideias sobre os principais problemas municipais com os participantes da XIII Marcha dos Prefeitos, em Brasília. Os três candidatos responderam às dez mesmas perguntas formuladas pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM).

Com algumas diferenças, todos se comprometeram a refazer o pacto federativo, diminuindo o peso da União, e a buscar um encontro de contas entre as dívidas que o governo cobra dos municípios na Previdência e o que os municípios estimam que deveriam receber da União em contrapartida.

A CNM convidou para o encontro os três primeiros colocados, com base nos números da última pesquisa do Instituto Datafolha. A ordem das exposições foi definida por sorteio.

Primeiro a falar, Serra criticou a decisão do governo Lula de promover a redução tributária sobre o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para aumentar o consumo. Segundo Serra, essa decisão prejudicou os municípios. “É muito errado se fazer redução de impostos temporária e os municípios pagarem a conta. Então, mais de quatro mil municípios perderam praticamente uma receita sem recuperação. Perda essa que continuou neste ano. Tem que acabar o procedimento de generosidade com chapéu alheio”, afirmou Serra.

Marina Silva defendeu a criação de um “Sistema Único de Educação, a exemplo do Sistema Único de Saúde (SUS), criado com a Constituição de 1988. Centrando seu discurso na melhoria da educação, ela também defendeu que os investimentos na área passassem dos atuais 4% do Produto Interno Bruto (PIB) para 5% do PIB.

Ministra até há poucos dias, Marina foi mais dura e crítica com o atual governo do que Serra. Ao comentar os problemas na distribuição de recursos para combater calamidades públicas, ela disse que os recursos chegaram apenas à Bahia, e mesmo assim atrasados, porque esse é o estado do ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima. E fez uma crítica indireta a Dilma Rousseff. “O Brasil não precisa de um gerente. O Brasil precisa de um líder com visão estratégica”, afirmou.

Última a falar, Dilma defendeu, sob aplausos, uma nova distribuição dos recursos dos royalties do petróleo de forma mais equânime entre os municípios, como defende a CNM. Ela, porém, defendeu um entendimento na mudança das regras e o respeito aos preceitos constitucionais sobre o tema.

“Acho que devemos buscar um entendimento. Há esse pleito legítimo dos municípios de distribuição, mas há a determinação constitucional que estabelece recursos para os estados produtores", disse Dilma. Dilma, no entanto, ressaltou que mais importante que a questão dos royalties é a regra da partilha de recursos na exploração do pré-sal, e a criação do fundo de investimentos que será criado.

Veja, em resumo, como os três candidatos responderam às perguntas formuladas pela Confederação Nacional dos Municípios:

O governo faz desoneração tributária retirando recursos da fatia dos municípios. Quando o governo vai parar de fazer bondade com o chapéu alheio?

Serra: “Tem que acabar esse procedimento da generosidade com o chapéu alheio. É muito errado se fazer redução de impostos temporária e os municípios pagarem a conta. Tem que haver um mecanismo que preserve a participação da União, dos estados e dos municípios. Não dá para os municípios assumirem cada vez mais responsabilidade sem os devidos recursos”.

Marina: “Desonerar não é uma coisa ruim. O errado é desonerar sem critério. Toda vez que o governo faz desoneração faz em cima da receita dos municípios. Enquanto não pudermos fazer uma reforma tributária, temos que, pelo menos, fazer uma repactuação. A gente precisa repactuar valores e responsabilidades. Esse é um acerto que precisamos fazer desde a Constituição de 1988. Não dá para aumentar responsabilidades sem recursos”.

Dilma: “Nessa última crise, fomos os últimos a entrar e os primeiros a sair. Nós criamos uma medida compensatória para os municípios que foi a recomposição das receitas ao nível de 2008. Ter recomposto essa receita foi um momento importantíssimo no embate contra a crise. Sou a favor do diálogo para discutir o chapéu. Com diálogo, se faz. Não se faz com os cães e a polícia contra os reféns. A verdade é que quando fizemos a descentralização das responsabilidades na Constituição de 1988 não fizemos a mudança tributária necessária. É impreterível que nessa nova etapa coloquemos na ordem do dia a questão da reforma tributária. O Brasil precisa simplificar a legislação tributária, desonerar a folha de salários, diminuir a guerra tributária”.

O candidato é a favor da emenda 29, que fixa os percentuais mínimos para investimentos em saúde ou defende algum outro mecanismo de financiamento da saúde?

Serra: “Falta uma lei regulamentando os gastos com a saúde. Em alguns lugares, uma estrada passa na frente de um hospital e isso é computado como gasto com saúde. É preciso haver um gasto melhor com saúde. Houve uma desaceleração no setor. Quem paga por isso são os estados e, principalmente, os municípios”.

Marina: “Criação de qualquer nova contribuição só com a reforma tributária. Não dá mais para ficar criando puxadinhos tributários. Defendo a convocação de uma Assembleia Constituinte Provisória para fazer as reformas de que o país precisa. Sei que não é fácil fazer as reformas. Se fosse fácil, o sociólogo (referência a Fernando Henrique Cardoso) faria a reforma política. Se fosse fácil, o operário (referência a Lula) faria a reforma trabalhista”.

Dilma: “Assumo o compromisso de lutar pela PEC 29. Mas não sou uma pessoa que se presta á demagogia e proselitismo eleitoral. Sabemos que houve uma perda de R$ 40 bilhões com o fim da CPMF. Sabemos que cada gasto tem que ter a receita correspondente. Mas sabemos que o Brasil entrou numa trajetória de crescimento. Na certeza de que o Brasil entrou numa nova era de prosperidade é que acho que é possível mais recursos para a saúde. Muitos estados contabilizam como gastos com saúde gastos que não são para saúde. E não colocam a parcela obrigatória de 12%. Os recursos virão daí”.

Necessidade de aumentar recursos para creches no Fundo de Educação Básica

Serra: “Não dá para aprovar lei no Congresso que implique gastos para os municípios sem ouvir os municípios. Criar despesa sem criar o recurso correspondente é, na minha opinião, inconstitucional. No caso das creches, subestimou-se o custo por aluno. Manda cumprir, é um objetivo generoso. Mas onde está o dinheiro? O município fica como Carlitos no filme “O Grande Ditador”: o marechal alemão manda o general avançar; o general repassa a ordem para o coronel; que repassa para o major; que repassa para o tenente; que repassa para o capitão; que repassa para o sargento; que repassa para o cabo. No fim, o Carlitos, no fim da fila, é que avança sozinho”.

Marina: “As creches não podem ser vistas como meros depositários de crianças. Podemos pensar em saídas inovadoras. Talvez pagar uma remuneração à própria mãe qe prefira ficar em casa. Mas temos que trabalhar para que os recursos para educação sejam aumentados. Defendo a criação de um Sistema Único de Educação, a exemplo do Sistema Único de Saúde. Devemos também aumentar os investimentos em educação dos atuais 4% do PIB para 5% do PIB."

Dilma: “O governo tem que garantir o custeio das creches. Esse é um programa prioritário porque pode salvar uma geração. Não farei qualquer tergiversação ou qualquer economia com a questão das creches. As creches serão uma das coisas mais importantes no próximo mandato. Se fizermos isso, mudamos a face do nosso país”.

Leis que geram despesa sem a contrapartida necessária, como o Piso Nacional do Magistério

Serra: “Piso nacional do magistério, não sou contra não. Mas tem que haver o recurso. Era preciso criar um dispositivo constitucional – para mim, isso já é claro – que diga que não se pode criar despesa sem receita”.

Marina: “Se não tivermos o comprometimento das três esferas da União, não tem como não sobrecarregar os municípios. É preciso haver um compartilhamento das responsabilidades. Mas temos que nos comprometer com um piso nacional do magistério. Toda vez que me dizem que não tem dinheiro para educação, eu lembro que o que se investe em educação é quase o mesmo que se perde com a corrupção”.

Dilma: “Um país que se respeita tem que respeitar seus professores. Eu tenho a convicção de que não se transformará a nossa educação qualitativamente sem melhorar salário e a formação do professor. O presidente Lula começou e eu perseguirei esse compromisso de forma continuada. Aumentamos significativamente o salário mínimo, e nem por isso a economia ficou fora de controle. Concordo que alguns municípios não tenham recursos para pagar o salário mínimo e o piso dos professores. Mas isso não pode impedir que se faça. Como superar as dificuldades, tem que se discutir num forum como esse. Falam que nós seremos em breve a 5ª economia do mundo. Mas não podemos ser a 5ª economia do mundo apenas por causa do nosso PIB. Tem que ser por causa do nível de vida da nossa população. E, aí, a educação, cumpre um papel estratégico”.

Distribuição equânime dos royalties do petróleo

Serra: “Essa questão é complicada porque foi posta em um ano eleitoral. Deveríamos deixar essa questão para ser examinada posteriormente. Porque, agora, gera um clima fratricida. A minha posição é que os municípios deveriam ter acesso aos recursos. Agora, tem dois estados, Rio de Janeiro e Espírito Santo, que vivem dos royalties. Se fechar da noite para o dia, municípios como Campos (RJ) quebram. Rio de Janeiro e Espírito Santo entram em colapso”.

Marina: “Creio que é preciso se preservar os contratos já firmados. Mas a minha posição é que não se faça essa discussão agora, mas depois das eleições. É um quadro de altíssima responsabilidade. Não dá para ficar fazendo frase de efeito. Na eleição, cada frase de efeito é uma maravilha. Depois, são 16 anos de negativas e choro. Se para ganhar, eu tenho que ficar dizendo que tudo de bom que existe foi feito por mim e que tudo de bom no futuro só será feito por quem for indicado por mim, isso é a ética da circunstância. Os royalties do petróleo têm que ser revertidos para o desenvolvimento de uma nova tecnologia de baixo carbono”

Dilma: “Eu tenho certeza que a riqueza do petróleo, principalmente essa nova do pré-sal, é de toda a nação brasileira. Mas a grande riqueza do petróleo não está nos royalties. São os recursos que vão para o fundo que criaremos para financiar, entre outras coisas, educação e cultura. Royalties também é problema. E defendo a proposta de distribuição para todos os municípios. Acho que temos que buscar um entendimento. Há esse pleito legítimo dos municípios, mas há a determinação constitucional”

Encontro de contas das dívidas da Previdência (a União cobra R$ 22 bilhões dos municípios, e os municípios estimam que a União lhes deve R$ 26 bilhões):

Serra: “A União pode tirar recursos dos municípios, tirando do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), mas o contrário não pode. Sou totalmente a favor que se faça um encontro de contas”.

Marina: “Esse encontro de contas é uma necessidade, mas é complicado de ser feito. Será preciso um trabalho meticuloso, indivíduo a indivíduo”.

Dilma: “Encontro de contas é a forma racional quando se tem dívida de ambas as partes”.

Distribuição de recursos para combater calamidades públicas

Serra: “As calamidades estão se tornando rotina, não sei se por conta do aquecimento global. Temos que nos preparar. Temos que ter reservados recursos que não serão remanejados de modo algum para permitir uma solução mais ágil”.

Marina: “Em 1992, na Rio 92, os cientistas já nos alertavam para o que chamavam de eventos extremos. Chuvas prolongadas, secas prolongadas, ventos fortíssimos. Exatamente os eventos gravíssimos que São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Rio Grande do Sul passaram. Fomos alertados mas, infelizmente, fizemos muito pouco. Agora, os recursos para calamidades só chegaram à Bahia, e muito tardiamente, porque o ministro Geddel Vieira Lima é de lá. O Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe) tem condições de antecipar em quatro horas essas situações de risco. Podemos fazer ações compartilhadas para que as pessoas não fiquem com suas vidas ameaçadas a cada ano”.

Dilma: “A Defesa Civil ampliou seus recursos para R$ 1,7 bilhão. Como ministra da Casa Civil, percebi duas coisas. A primeira é a morosidade no repasse dos recursos. E, nesse caso, penso que é preciso se trabalhar com a figura da doação. A segunda coisa é a necessidade da reconstrução depois que passa a fase crítica. É importantíssimo que haja uma ação conjunta dos vários ministérios para atuar nessa reconstrução”.

Fim das emendas individuais ao Orçamento com a criação de um fundo de investimento para os municípios com os recursos hoje previstos para as emendas.

Serra: “Não é viável impedir emendas individuais. A questão fundamental é estabelecer um modelo de direcionamento para as emendas. É por falta desse direcionamento que o recurso hoje se pulveriza e se dispersa, e a liberação acaba sendo esse atropelamento, esse calvário. Mas não podemos jogar a criança fora junto com a água da bacia. Além disso, o Congresso jamais aprovaria o fim das emendas individuais”

Marina: “Quando estava no Ministério dos Meio Ambiente, organizei a distribuição de recursos por programas para não haver essa pulverização que não junta lé com cré. Sou favorável à criação de um mecanismo para que os recursos orçamentários sejam aplicados da forma mais responsável possível”.

Dilma: “Temos que enterrar definitivamente a época do pires na mão. Poderíamos estudar junto com os parlamentares a criação de um banco de propostas para beneficiar os municípios. O fundo é uma coisa que podemos negociar. Quanto às emendas, se há uma boa sugestão, não vejo por que não acolher”.

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